sábado, 8 de outubro de 2011

A BANDA E EU

Quando a banda de ofício era o compasso das cidades, as festas e acontecimentos importantes eram regidos e saudados por elas. De longe se  sentia o som do bumbo, do prato e dos inconfundíveis sopros dos pistons e clarinetas, que levavam às portas e janelas os olhares com encanto mágico,  dos pequenos, médios, grandes e velhos, senhores e senhoras, meninos e meninas, casais e namorados. E eu desejando estar no lado oposto. Queria as baquetas do tarol ou a vareta do bumbo enrolada nas mãos e batendo num som bonito, perfilado, com uniforme passado a vinco, mas tinha vergonha do destaque ou medo do fracasso. 

            Depois de passados anos até que se possa pensar no que foi feito da vida e dos desejos não realizados dá para perceber com muita certeza o quanto é bom se viver e aprender as coisas sem repressão e opressão. A autoconfiança, estima elevada e destemor do novo são alavancas da criação. Não movem o mundo mas deixam-no menos doído e mais belo. Dá até vontade de viver longamente na esperança que esse mundo aconteça de verdade. 

            Tinha em criança um ouvido que batia, batia, batia já com ritmo que parece ter nascido comigo dos tambores dos ancestrais ou das músicas das ruas, das rádios e das festas. Só sei que batia sempre em meu ouvido. E deu um gosto pela percussão que eu usava lata, tampo de mesa, caixa de fósforos e tudo que chacoalhasse em som de bateria. Menos os instrumentos de verdade que eu amava, surdo, tarol, xiquexique, reco-reco, zabumba, cuíca e pandeiro mas que me metiam medo. 

            Entre tantas frustrações, que eu julgava serem frutos da timidez, descobri que se tratava simplesmente de medo de fazer bonito a acharem feio. Medo de destacar e ser taxado de aparecido, esnobe. Medo de o auge ser vizinho do abismo. Acreditava que já tinha um destino traçado por uma força superior ou por uma ordem superior, seja dos pais, da escola, ou uma ordem natural dos caminhos retos que levariam todos a algum lugar. Por isso eu só vi a banda passar.

7 comentários:

  1. Que pena!Quem sabe quanto terias tocado bonito e encantado, engrossando os sons lindos daquelas bandas de antes dos colégios!

    abração,chica

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  2. E muitas vezes deixamos passar tantas coisas, por medo do que vão pensar...
    Paz e bem

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  3. Que lindo. Vc escreve com a alma. Parabéns!
    P.S.: Vc foi a ganhadora do 1º sorteio do Palavra Inquieta! Quero entregar seu mimo junto com meu carinho sincero. Faz contato comigo via e-mail? Te espero. Bjs inquietos.
    andreiajacomelli@oi.com.br

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  4. Bom dia, querido amigo Cacá.

    Menino... Seu texto me emocionou demais!!
    A Banda da minha terra tocava no meu coração... Na minha alma!

    Eu sugava todos os sons, e adorava o toque dos "pratos".
    Nas procissões, eu sempre me colocava o mais perto possível, para intensamente mergulhar naquele êxtase.

    A Banda de Mariana parecia uma grande orquestra.

    Quando em 1961, fomos morar perto da Rua Direita, o meu pai me levava junto da outra minha irmã, para assistirmos os ensaios dela.

    O Maestro colocava as cadeiras num canto, para nós. Quem olhasse nos olhos do meu pai, via que parecia que ele sozinho, tocava todos os instrumentos.

    Menino... O ensaio começava com a música, "O GUARANY". Depois, vinha as músicas sacras... outros clássicos, e até a "Marcha Fúnebre".
    Afff!

    Eu viajei no seu relato e senti as suas emoções.
    Parabéns por tudo.

    Obrigada pela linda postagem.

    Beijos.

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  5. Cacá, esse texto é meu!!! rsrs
    Exatamente tudo o que passei, tive tanta vontade e nunca participei de uma bandinha que fosse!
    Seu último parágrafo é simplesmente perfeito. (só posso ignorar esse nó na garganta e limpar os olhos rapidamente...Já passou!)
    Bom domingo!

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  6. Obrigado, minha gente , pelos comentários. Esse texto realmente me emociona quando me lembro desta fase de minha infância. um abraço a todos e todas. Paz e bem.

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  7. Primeiro de tudo, não posso negar que me lembrei de imediato das palavras escritas por Chico Buarque e tão bem cantadas por Nara Leão, "A banda".

    Deixamo-nos seduzir e encantar pelas bandas que passam, sonhamos em estar nelas, mas nos prendemos a "realidade", nos satisfazendo apenas em achar bonito.

    Belíssimo texto.

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